AUTOCRACIA

1.22.2005

Autocracia II
MC Escher - Hand With Reflecting Sphere

Finalmente, depois de muito divagar, ao longo destes últimos dias, vou poder concentrar-me mais uma vez na questão essencial deste blog – a Autocracia.
O ideal autocrata como eu o proponho nasce de um sentimento de impotência típico da sociedade ocidental face ao abismo entre povo e estado, entre o Demos e a Kratia.
Como Winston Churchill bem observou: “a Democracia é a pior forma de governo, à excepção de todas as outras já experimentadas”.
O erro de Churchill foi admitir que existe uma Democracia. A definição clássica, como era entendida por Platão, Aristóteles e Sócrates, referia-se apenas a uma “democracia directa”, enquanto que a “democracia por representação” é simplesmente uma República. Neste sentido estricto a Democracia nunca foi alcançada.
Mas aceitemos, por razões de lógica (perdão a Aristóteles), o modelo contemporâneo.
O modelo democrático parte de uma simples premissa: a totalidade populacional de uma nação deve concorrer para a eleição de um grupo de representantes que a governe, visto que o universo em causa é incapaz de funcionar como um todo que possa contribuir sucessiva e constantemente para a função governativa nacional. Ou seja, porque todos os portugueses, por exemplo, não podem reunir-se numa única sala para tomar decisões legislativas, parlamentares, estratégicas, políticas, etc, cada português deve abdicar do seu direito de auto-governação e tranferir esse poder por meio de um voto a um candidato que considere apto a representá-lo nessas tarefas.
Esta premissa, embora superficialmente correcta, é essencial errada se se considerar que é realmente possível à totalidade da população do país reunir-se no mesmo momento, no mesmo local. Efectivamente nos primórdios da Democracia considerar sequer essa possibilidade seria aberrante pois era por demais óbvio que dez milhões de pessoas não poderiam sentar-se no mesmo sítio e comunicar dez milhões de opiniões, cada uma multiplicada pelo número de argumentos apresentados. Mas hoje em dia podemos sonhar com isso porque a sala em questão não tem de ser real. Hoje podemos reunir-nos a partir do conforto de nossa casa (tele-conferência), conversar aos milhares em salas virtuais (chats), podemos participar em decisões globais por telefone (SMS)… Já se pratica inclusive o ensino à distância! Porque não o governo à distância? O presente exercício de opinião nesta blogosfera e a adesão em massa a este meio que se observa são denominadores de tal ordem poderosos que sugerem por si só a sensatez deste enunciado.
Ainda precisamos realmente deste modelo obsoleto de governação? Devemos suportar por ainda mais tempo sermos mal representados, mal governados, tornados ignotos e impotentes? Devemos continuar a eleger fantoches com agendas que desconhecemos e interesses que ignoramos, para que estes negoceiem em sigilo na moeda política do favor o nosso próprio futuro?
A Democracia significa o "poder do povo" mas essa noção não só é enganosa, como é imbecil e contraditória. É enganosa porque o "poder do povo" é simplesmente o poder de abdicar desse poder a favor de um partido, ou nem mesmo isso pois nesse caso uma abstenção deveria significar uma perda de poder para o partido em causa e, no entanto, é simplesmente insignificante; é imbecil porque ao mesmo tempo que considera existir algo chamado “povo”, pressupõe que este é nada mais nada menos que um conjunto heterogéneo de indivíduos que, pela sua individualidade, é inconciliável numa única corrente ideológica passível de exercer um poder de soberania.
Gilles Deleuze, um teorista françês, comparou o acto de votação para uma representação política, com um acto de aquisição de reféns. Um governo representativo assume que as pessoas podem ser divididas em categorias com distintos interesses comuns e a representatividade é vista como o empossamento dos interesses de grupo. Muitos movimentos sociais foram bem sucedidos em alcançar o poder governamental: a classe operária, o movimento feminista, minorias étnicas, etc. Contudo, não há nenhuma forma de governo que represente a população de acordo com as características de todas as suas categorias, baseando-se apenas em estratificações ideológicas identificadas pelo acto eleitoral. Estas nem sempre correspondem às verdadeiras convicções do eleitor, mas são antes sinónimo de uma posição estratégica resultante de um conformismo com as doutrinas evidenciadas pelos partidos existentes. A única verdadeira representatividade governamental de uma população é a própria população e o poder deve então ser distribuído pelo indivíduo. A Autocracia como a concebo é o sistema que permite ao indivíduo governar-se a si mesmo e ao seu país sem intermediários e continuarei, ao longo da existência deste blog, a tecer melhores aproximações à concretização desse sistema num todo consistente...

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