2.19.2005
Em Véspera de Democracia
Tenho uma confissão algo vergonhosa a fazer: nestas eleições vou votar PSD. Sim, já sei, o voto é secreto. Mais valia estar calado. Mas infelizmente não posso. Apesar de ir contra quase todas as minhas convicções políticas, foi essa a decisão que tomei.
Não vos passa pela cabeça o ambiente lá em casa depois de, em resposta à pergunta da minha mãe:
- "Então vamos votar nos comunistas este ano?"
Eu imediatamente ter respondido:
- "Nem pensar!!!"
Mais tarde vim a saber que o meu (orgulhoso) pai chegou à mesma conclusão que eu e vai votar na mesma direcção. O meu irmão não se descose...
Para concluir a pintura deste lindo quadro resta intuir a seguinte equação:
[(Uma comunista convicta - um comunista desiludido)
x um anarco-socialista (ahem) + um bloquista-nihilista]
x número de famílias portuguesas com divisões semelhantes
= uma feliz economia farmacêutica.
Todas estas divergências só existem porque tive a sorte de nascer no seio de uma família extremamente liberal. Nunca fui baptizado, oprimido ou politizado (nessa ordem de importância ;)...
Mas voltando à questão essencial, tenho de me justificar. Porque é que alguém completamente anti-capitalista e anti-corporativista, alguém que abomina a propriedade, os nacionalismos, as ortodoxias, etc é capaz de votar num partido que é exactamente o oposto de todas essa convicções? Porquê votar anti-eu? Simplesmente porque voto sem egoísmo. Porque acredito que esse acto deve ser realizado em consideração dos meus pares, porque isso é democracia. O voto não deve ser um acto acéfalo, fruto da simples e arrivista filiação num partido, por exclusão de partes ou ilusão de que isso é tudo. Não deve ser um conformismo prático, resultado da desilusão perante os erros de todos os governos. E acima de tudo não deve ser reaccionário, como foi a eleição do PSD pós-guterres e desconfio será a eleição do PS pós-Barroso/Santana. Vota-se por um instinto de mudança e a mudança nunca se dará se o instinto permanecer esse. Andamos a jogar ping-pong da esquerda para a direita, quando na realidade nem esquerda nem direita existem em portugal e a única resposta sã é a brancura do papel.
No entanto, não é em branco que vou votar, estou farto de votar em branco. Mas também não é por estar farto de votar em branco que vou votar PSD. Tenham paciência enquanto me explico...
Na minha visão e sem querer ferir susceptibilidades ou insultar os ideais de ninguém, acredito no seguinte:
- Votar em branco nada significa;
- Votar CDU é votar na oposição;
- Votar Bloco de Esquerda é ser irresponsável;
- Votar PP é ser retrógado;
- Votar PS é ser imbecil;
- Votar PSD é ser imbecil.
Mas descriminemos isto...
- No caso da CDU pós-Carvalhas já nem se pode ter a certeza de se estar a retirar poder a uma maioria PS, pois já foi assinalada a abertura do partido a uma aliança pós-eleitoral com um PS sem maioria absoluta. Nesta conjuntura, votar CDU é votar PS.
- Quanto ao BE, aprovo muitos dos seus ideais e apoio o seu liberalismo, mesmo quando por vezes roça extremos de ridículo. Mas tenho de admitir que enquanto força política são por enquanto insignificantes, mesmo no panorama da oposição, até porque sempre foi essa a função que ocuparam e já ninguém lhes dá muito valor. De uma forma um pouco dura, pode dizer-se que são o rebelde adolescente da política (e ninguém suporta adolescentes). Receio bem que seria um perigo um grupo como o BE conquistar o poder executivo.
- Quanto ao PP, não vou coadunar com o ódio de estimação que os media portugueses propagaram sobre a figura do "aliterado" Paulo Portas, mas a verdade é que as suas acções políticas não devem nada ao seu discurso de extrema direita conservadora. A valorização das Forças Armadas, o retorno aos valores e costumes preconceituosos e ostracizantes de um Portugal idealizado, o cristianismo retrógado e o próprio nacionalismo saudosista, tão incendiário que me arrepia sempre, ao remeter-me para o nacional-socialismo alemão. Temo muito o poder de sedução destes ideais, quando sabemos poderem ser tão belos (não esqueçamos que o nacional-socialismo tem origem na Áustria, na ideia emergente do Volk, na procura de raízes históricas que construíssem uma identidade alemã, e acabou encontrando-as no povo ariano) quanto destructivos.
- Os casos do PS e do PSD são óbvios. Enquanto partidos titânicos em Portugal funcionam cada vez mais como uma Sindicato de Políticos, do que propriamente como partidos com preocupações legítimas com a actualidade nacional e com as causas portuguesas. São uma Grande Loja Maçónica protectora da sagrada Cosa Nostra e dos seus ilumindos Irmãos, com iniciados espalhados tentacularmente por todas as institituições nacionais. Desde os sindicatos às associações de estudantes, esta confraria abrange quase todos os pontos nevrálgicos de concentração de poder no nosso ridículo país. Este único assunto seria suficiente para um blog à parte e vou-me abster de me alongar mais. Deixo aos vossos intelectos as elações.
Uma vez mais, insisto, não pretendo ofender ninguém, mas se não consegui refrear a paixão que nutro por estes assuntos e feri mesmo assim alguma sensibilidade, estejam à vontade para me recriminar. Como alguém já o disse: posso não concordar com a tua opinião, mas lutarei para que tenhas o direito a exprimi-la ;)
De qualquer forma, ainda não fui claro, a única coisa que fiz foi assinalar a inexistência de alternativas políticas dignas em Portugal. E isso não só não é novo, como já é exasperante ouvi-lo.
Vou votar PSD por uma única razão: é a coisa mais democrática a fazer. Da mesma forma que acho mais importante o Direito à opinião do que a minha própria e solitária opinião, também acho muito mais importante o Direito ao Poder do que a simples filosofia de quem o detem. Refiro-me ao acto anti-constitucional, fascista e amoral do nosso simpático PR ao dissolver a Assembleia da República. Embora já não se leia uma linha sobre este assunto nos jornais, ou se ouça uma palavra nos noticiários, em mim ficou marcado indelevelmente como um trauma de infância! Já se assassinaram presidentes por muito menos! É incrível como não só não nos deu qualquer razão concreta para o acto que cometeu, como foi capaz de afirmar que nada devia explicar aos portugueses (para que saibam, neste momento estou a teclar como um pugilista). Sinceramente, por mais que pense, não encontro razões de fundo para esta decisão presidencial, a não ser talvez aquilo que em inglês se denomina uma "power-trip". A única teoria que julgo possível é a de que ao cometer a inconstitucionalidade de empossar o substituto de Durão Barroso, o nosso PR tenha sido vítima de uma epifania, tenha tido uma visão de Deus em que o Criador lhe transmitiu a Sua vontade de fazer uma experiênciazinha social e, por instinto messiânico, convencido de que após essa idolopeia se tinha tornado o umbigo da humanidade, um vortex de energia onírica, decidiu não desperdiçar esse poder e logo a seguir dissolveu a Assembleia. Se esta teoria estiver correcta, o mais tardar em Março deverá haver nova dissolução. lol. O que me faz pensar se terá sido coincidência a Irmã Lucia nos abandonar para ir ter com o Criador logo nesta altura? hummm....
Ou isso ou o PSD ter avançado com a proposta de acabar com o sígilio bancário, ou por ter decidido vender o património público a exploradores privados. Bem que pode ser. É verdade que não só a UE não aprovou a venda e apenas autorizou o aluguer, como demorou meses suficientes até Bagão Félix receber a resposta já em situação de governo de gestão. Talvez ao vendermos o
património, o tesouro público aumentasse de tal forma, que seríamos um perigo económico para o resto da Europa. lol! Cotas de pesca? pff... nós temos ruínas, meu amigo! Ruínas e ermidas!
património, o tesouro público aumentasse de tal forma, que seríamos um perigo económico para o resto da Europa. lol! Cotas de pesca? pff... nós temos ruínas, meu amigo! Ruínas e ermidas!
É essa maioritarimente a razão pela qual vou contra os meus princípios, votando à direita pela primeira vez na vida! Porque acredito que Santana Lopes nunca teve um momento de fôlego que lhe permitisse governar e merece no mínimo o benefício da dúvida. Se acrescentarmos a isto o facto de o PS não ser em nada melhor que o PSD. Se acrescentarmos a isto o facto de José Sócrates ser um verdadeiro zero à esquerda que só poderia mesmo ganhar umas eleições numa altura em que toda a gente está farta de PSD. Se juntarmos a isto o facto de o meu voto em qualquer outro partido não oferecer mais qualidade à vida política portuguesa e um voto à esquerda só beneficiar o PS. Se acrescentarmos a isto o facto de um voto em branco ser um protesto oco numa altura em que devemos protestar contra mais do que o recorrente bode-expiatório de todas as culpas: o Sistema. Então a minha decisão é fácil.
Alea Jacta Est e até segunda!
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